sábado, 14 de agosto de 2010

Parte 3

Conclusão: Crise da sexualidade e crise da fé no atual mundo árabe-muçulmano

“Esses diversos ajustamentos históricos fizeram, pois, com que a ética sexual vivida pelos muçulmanos e a visão do mundo pressuposta por essa ética tivesse cada vez menos relação com as generosas declarações alcorânicas e maometanas.” (p. 303)
– O capítulo 4 se mantém no plano ideal. Apresenta a lógica de comportamentos e regras dentro do Islã no âmbito teórico, no ideal que a religião pretende. A conclusão ante aos “ajustamentos históricos” e ao distanciamento das declarações alcorânicas e maometanas detém-se na análise da sociedade, identificando as mudanças na lógica ideal do Islã a partir das leituras particulares do Alcorão pelas sociedades que se assentaram sobre a religião islâmica.
A colonização constituiu-se em um importante fator que levou a um ajustamento histórico. Ante a dominação do ambiente e do meio a reação do muçulmano foi a preservação da intimidade da família limitando a relação com o outro à exterioridade.
Desse modo mantida a identidade coletiva, a esposa, a mãe, a mulher muçulmana adquire papel central pois será ela a guardiã da tradição quando o marido deixa o ambiente dominado e adentra o lar em que tudo se mantém ordenadamente.
“Até o fim, pois, a ética sexual do Islã e os papéis que ela atribuía à mulher assegurarão uma função renovada e a mãe servirá de refúgio e de abrigo à identidade coletiva.” (p. 305)
Em seguida Boudhiba descreve os impactos sociais da modernidade na medida em que insere novas tecnologias e recria costumes e valores.
“As distorções da infeliz história dos países árabe-muçulmanos não se limitam, pois, apenas ao plano político. Elas também devem ser inferidas dessa odisséia de percepções de si mesmo como corpo, tendo que manter com a natureza e com o outro relações amplamente perturbadas por uma tecnologia terrivelmente indiscreta.” (p. 307)
No entanto toda a mudança advinda com a modernidade não representa, à mulher muçulmana, a adoção de novos costumes e valores, a adoção do progresso inevitável, mas na verdade a uma recusa do passado. Enfatiza-se na sociedade muçulmana a negação do antigo e não a afirmação do novo.
Visto que a emancipação sexual é a uma idéia da modernidade, aderi-la pressupõe a negação da tradição. Mas como fora dito a mulher se tornou pra sociedade muçulmana a guardiã da identidade coletiva assentada na tradição.
Descreve-se, adiante, uma série de situações envolvendo mulheres que escreveram à revistas femininas e determina-se ante ao desejo de viver da mulher árabe o terreno da sexualidade como o único válido para a liberação da mulher.
O autor conjuga a emancipação feminina à emancipação masculina, retomando a idéia de harmonia do capítulo 4. “A liberação da mulher passa pela liberação do homem. Esse é o preço que deve ser pago para que se realize a harmonia do casal, e, portanto, da sociedade.” (p. 314) Aborda, portanto, um assunto da modernidade sob aspecto da tradição.
Favorável a liberação sexual critica os modelos tradicionais e os importados como ambos andrólatras e atenta por uma batalha da modernidade em todos os níveis. Ultrapassa os limites de uma revolução sexual e clama para que se lute contra os privilégios também políticos, econômicos e financeiros.
Pontua a princípio uma crise sexual e religiosa, para, em seguida, determinar uma crise total da consciência humana. “Essa crise que testemunha a dificuldade que experimenta a sexualidade em se definir em um contexto no qual a modernidade é apreendida ao mesmo tempo como recusa de um inextinguível ontem e como a vontade de viver um amanhã que tarda um pouco a chegar.” (p. 323)
Retoma, finalizando, a questão da sexualidade:
- crise sexual como uma crise nas relações interpessoais na medida em que sexualidade é o diálogo com o outro.
- deixa clara uma crítica à modernidade e uma exaltação da tradição do Islã, entretanto sem medir ou refletir em formas práticas a essa realização.
“Organizando sobre uma base institucional o jogo sexual, introduzindo nele uma sofisticada dialética do público e do privado, do lícito e do ilícito, o Islã dava sentido positivo à sexualidade. Isto é, um sentido positivo a si mesmo e ao outro. Privando a sexualidade de seu mistério, eu me despojo de minhas próprias significações. Donde este erotismo sem alegria, sem odor, sem cor, sem sabor, e que apenas é bestialidade.” (p. 324-325)
“Nada nem ninguém nascem por geração espontânea, e em matéria de cultura o legado pode ser alienado, e as mais autênticas revoluções são sempre as que sabem reencontrar as profundas continuidades do amanhã com o hoje e com o ontem.” (p. 326)

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